Broca-do-café

O que é necessário para que um inseto seja considerado uma praga-chave ou praga primária de uma cultura? Sua ampla distribuição geográfica? Seu alto potencial biótico e longevidade dos adultos? Sua capacidade de dispersão? Os danos que causa à cultura? Falta de produtos fitossanitários eficazes?

            Na cultura do café, um dos insetos que cumpre esses requisitos é a broca-do-café, Hypothenemus hampei (Ferrari, 1867) (Coleoptera: Curculionidae) [Curculionidae? Não era Scolytidae? Isso será objeto de postagem da sessão “novidades taxonômicas”, sigam o canal @smart.mip no Instagram]. 

A broca é considerada praga-chave no café e preocupa os cafeicultores das principais regiões produtoras de café do brasil e outras regiões do mundo.

As fêmeas adultas broca-do-café medem aproximadamente 1,7 mm de comprimento × 0,7 mm de largura e são elas que atacam, preferencialmente, a coroa do fruto, perfuram os grãos e ali depositam seus ovos. Os machos são menores e medem cerca de 1,2 mm de comprimento × 0,5 mm de largura e apresentam asas atrofiadas por isso não voam e ficam constantemente dentro dos frutos. As larvas que nascem desses ovos se alimentam dos grãos do café, danificando-os ou destruindo-os completamente.

            Para um combate eficiente aos nossos inimigos, há necessidade de conhecê-lo bem, desde sua bioecologia, dinâmica populacional, danos que causam, forma de detecção, até as táticas que podem ser utilizadas para o seu correto manejo.

 

Distribuição geográfica da broca-do-café

            A broca-do-café, assim como o próprio cafeeiro, não é nativo do Brasil e foi introduzida em São Paulo, provavelmente em 1913, junto às sementes importadas da África e de Java. É uma praga que está distribuída por toda a faixa Tropical do globo terrestre, ocorrendo em mais de 80 países.

 

Condições ambientais que favorecem a praga

Os períodos chuvosos e invernos úmidos, os cultivos adensados, as  áreas de baixada e as partes baixeiras da planta  (com baixa incidência de luz e pouco arejamento) possuem as condições que favorecem o desenvolvimento dessa praga. Qualquer manejo que visa à modificação dessas condições será benéfico no controle da broca-do-café.

 

Potencial biótico e longevidade dos adultos

O ciclo completo da praga leva entre 20 a 37 dias, dependendo de algumas condições bióticas e abióticas. O período larval, fase que também causa danos, é de 15 dias à temperatura de 27 °C. A longevidade dos machos é de, aproximadamente, 40 dias e das fêmeas, em média, de 156 dias. Nesse período as fêmeas depositam de 31 a 119 ovos/fêmea. O número de gerações é de 6 a 11 por ano. 

 

Capacidade de dispersão

Após o acasalamento, as fêmeas que sobreviveram na entressafra nos frutos remanescentes nas plantas, ou no solo, saem do fruto nativo para colonizar outros frutos. A “época de trânsito da broca” ocorre entre 80 a 90 dias após a florada. No entanto, nesse momento não as fêmeas depositam ovos devido à alta umidade dos grãos, iniciando a postura apenas 50 dias após. A saída dos frutos para colonizar outros frutos ocorre por estímulo de luz, temperatura e UR e, também, por atração por voláteis das flores e frutos.

A intensidade de infestação da broca-do-café é maior no período com ocorrência de frutos na fase “chumbão” na planta, o que pode mudar de região para região, dependendo da época de floração.

 

Danos à cultura

Para Coffea arabica L., a broca provoca aumento da porcentagem de queda natural de frutos da ordem de 8 a 13% e, para Coffea canephora Pierre & Froehner (Conillon) da ordem de 46%, por ser mais suscetível ao ataque da broca.

Além de provocar a queda prematura do fruto, o ataque da broca traz perdas significativas no peso daqueles grãos brocados. As perdas em peso podem chegar a 20% em anos de alta infestação, o que corresponde a 12,6 kg por saco de 60 kg de café beneficiado. Verifica-se, também, a perda qualitativa, devido ao aumento do número de grãos brocados (5 brocados/quebrados = 1 defeito), o que deprecia o produto durante a classificação física. Além disso, inviabiliza a produção de semente, por causar seu apodrecimento. 

Os furos provocados pelos adultos podem se tornar porta de entrada para microrganismos. Fungos dos gêneros Fusarium e Penicillium penetram pela perfuração feita pela broca, podendo alterar a qualidade do fruto e, consequentemente, da bebida. O ataque da broca pode também causar alterações fisiológicas, induzindo a síntese de compostos químicos para proteção da planta que podem alterar a qualidade final do produto.

 

Monitoramento da broca-do-café

O monitoramento deve ser intensificado no “período de trânsito” da praga, que ocorre de 80 a 90 dias após a floração. Recomenda-se o monitoramento mensal da praga. Porém, em períodos de alta infestação o monitoramento deverá ocorrer quinzenalmente.

Em qualquer procedimento de amostragem, o primeiro passo é dividir o plantio em talhões, levando-se em consideração a idade das plantas, carreadores e cultivares plantados.

            Para amostragem da broca-do-fruto, devem-se escolher aleatoriamente 30 plantas por talhão. Cada planta escolhida deve ser dividida em terço inferior, terço médio e terço superior, para então o amostrador escolher 1 ramo em cada terço de cada lado da planta (Total 6 ramos por planta); cada ramo será um ponto de avaliação na planta. Na 1ª avaliação, não é necessária a coleta dos frutos, sendo que as observações serão feitas nos talhões e anotadas na planilha. Em cada ramo (ponto), deve-se visualizar 10 frutos nas diferentes rosetas e fazer a contagem de frutos perfurados e anotar na planilha. Somar os subtotais e dividir por 18 (fator fixo), se o resultado for maior ou igual 3%, é recomendável iniciar o controle químico.

Em outra recomendação, para realizar o monitoramento por meio da contagem de frutos atacados, é indicada a seleção de 20 plantas por hectare, caminhando-se em “zigue-zague” e escolhendo aleatoriamente as plantas. Em cada uma delas, coleta-se uma amostra de 100 frutos no terço médio de cada planta. Posteriormente, avalia-se a quantidade de frutos brocados e o percentual de infestação. Do mesmo modo, recomenda-se o controle se o resultado for maior ou igual 3%.

            O monitoramento pode ser realizado também por armadilhas, contendo etanol + metanol (1: 3). Recomenda-se a utilização de uma armadilha por hectare com cairomônio e sua avalição deve ser a cada 15 dias, para a contagem dos insetos adultos ou troca da substância (cairomônio). Para uma captura mais eficiente, as armadilhas devem ser colocadas à altura de 1 m do solo, entre as ruas do cafeeiro, afastadas umas das outras aproximadamente 50 m. No caso de alta infestação, a contagem dos insetos deve ser feita com periodicidade maior, a cada 3 dias ou, no máximo, semanalmente, para a leitura das capturas de insetos e manutenção.  Deve-se calcular a média do número de insetos por armadilha de cada talhão e o controle será feito quando, após o monitoramento, for identificada infestação próxima ao nível de controle. O nível de ação de 1% de frutos brocados com adultos vivos, equivale a 3,2 insetos capturados por armadilha/semana. Para 2 e 3% de frutos brocados, a densidade relativa é de 5,5 e 7,8 insetos por armadilha/semana, respectivamente.

 

Controle da broca-do-café

O controle da broca deve ser realizado quando, ao monitorar a praga, a infestação atingir o nível de controle. O controle químico é uma das principais táticas para o manejo da praga. Devem-se escolher inseticidas registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, priorizando o uso dos produtos com maior eficácia de controle, menor toxicidade e que ofereçam o menor impacto ao meio ambiente e ao aplicador. Além disso, há necessidade de observação da época de aplicação, dose recomendada, tecnologia de aplicação e período de carência. Para a broca-do-café, são registrados 25 produtos comerciais, entretanto, 11 tem como princípio ativo clorpirifós. Embora não haja evidência de resistência, recomenda-se a rotação de inseticidas de modo de ação diferente.

Em pequenas propriedades, o controle da broca-do-café pode ser feito utilizando-se de armadilhas contendo a mistura de etanol e metanol, na proporção de 1:3, acrescida de 1% de ácido benzoico. As armadilhas podem ser construídas com garrafas pet pintadas na cor vermelha. Para o controle eficiente, recomenda-se a utilização de 30 armadilhas por hectare. Se for utilizar um produto comercial para coleta massal (etanol [álcool alifático] + metanol [álcool alifático]), recomendam-se 25 armadilhas dispostas uniformemente no campo. A substância atraente deve ser substituída a cada duas semanas.

Em propriedades em que os tratos culturais e práticas de cultivo são delineados para favorecer a manutenção dos inimigos naturais, há um nítido benefício no controle da praga. Para os sistemas de cultivo que não minimizam ou racionalizam produtos fitossanitários, os produtores podem utilizar Beauveria bassiana, que é um fungo entomopatogênico eficiente no controle dessa praga. Atualmente, são disponíveis 6 produtos comerciais à base de B. bassaina registrado para o controle de H. hampei. A aplicação é recomendada em temperaturas entre 25 a 30 °C e umidade relativa do ar acima de 65%, com aplicação, preferencialmente, em dias nublados. O intervalo de aplicação e a dosagem podem variar de acordo com a infestação da broca e o produto comercial utilizado, sendo o monitoramento fundamental para a tomada de decisão.

            Dentre as táticas para o controle da broca-do-café, uma das principais é o controle cultural. A colheita bem feita, inclusive com repasses, com a máxima retirada de frutos da planta e do chão reduz a possibilidade de sobrevivência dessa praga para a próxima safra. Ao evitar que o ciclo se complete e diminuir os locais de manutenção da praga na entressafra, consequentemente, a população da praga na área será reduzida. 

 

Considerações finais

            Face ao exposto, é evidente e inquestionável o status de praga-chave/primária da broca-do-café, H. hampei. Caso seu controle não seja efetivo, essa praga causará danos quantitativos e qualitativos. Várias são as táticas de manejo, mas o controle biológico, cultural e químico são os principais. Para uma efetiva ação dos agentes de controle biológico e dos produtos fitossanitários, há uma clara necessidade de monitoramento da praga, seja utilizando armadilhas com cairomônio ou pela observação de frutos brocados.

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